O Projeto de Lei 1.462/2020 que propõe a suspensão temporária de patentes sobre toda e qualquer tecnologia em saúde que possa ser usada contra a pandemia da Covid-19 está tramitando na Câmara dos Deputados, em Brasilia (DF). O PL segue a ação de países como Alemanha, Canadá, Israel, Chile, Equador e Colômbia que tomaram medidas legislativas para favorecer a rapidez do acesso a tecnologias úteis para a contenção da pandemia.
Além de contribuir para o enfrentamento da pandemia do novo coronavírus, o PL 1.462/2020 prepara o Brasil para possíveis futuras pandemias ao definir que o dispositivo legal da Licença Compulsória (LC) entre em vigência desde o momento em haja uma declaração de emergência em saúde pública pelas autoridades brasileiras responsáveis ou, em nível internacional, pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
A medida, que já conta com o apoio do Conselho Nacional de Saúde (CNS), pretende retirar qualquer monopólio existente de dispositivos médicos, equipamentos de proteção individual (EPIs), medicamentos para tratamento e prevenção, vacinas, kits de diagnóstico, reagentes, entre outros, que possam combater a Covid-19. O Objetivo é favorecer a produção em quantidades suficientes e a preços acessíveis, para que a oferta seja universal, alcançando a todos que precisam, em especial populações mais vulneráveis e excluídas.
Veja a moção de apoio do CNS aqui.
O PL permite que o governo possa comprar produtos, patenteados ou com pedidos de patente, de qualquer fornecedor para agir na atual pandemia do novo coronavírus. Assim como permite a produção e comercialização por qualquer empresa ou laboratório – público ou privado –, com capacidade técnica de produção, sem nenhum impedimento legal por parte de proprietários de patentes. A medida vale pelo tempo em que a situação de emergência estiver decretada.
O PL 1.462/2020 é suprapartidário, pois conta com a autoria dos deputados Alexandre Padilha (PT/SP), Carmen Zanotto – CIDADANIA/SC, Jandira Feghali – PCdoB/RJ, Patricia Ferraz – PODE/AP, Dra. Soraya Manato – PSL/ES e Rodrigo Coelho – PSB/SC. Ainda, no dia 02 de abril, a Comissão Externa destinada a acompanhar ações preventivas da vigilância sanitária e possíveis consequências para o Brasil quanto ao enfrentamento da pandemia causada pelo coronavírus (CEXCORVI), presidida pelo deputado Dr. Luiz Antônio Teixeira Jr (Dr. Luizinho – PP/RJ), apontou o PL como prioritário para apreciação pelo plenário da Câmara do Deputados. A mesa diretora da câmara ainda não colocou o projeto em pauta.
Proposta legislativa coloca Brasil na vanguarda
O PL altera o artigo 71 da Lei nº 9.279/1996, a Lei de Propriedade Industrial, ao incluir um inciso que acelera a emissão de licenças compulsória em contextos específicos de emergência. O mecanismo estabelece um processo simplificado de licenciamento compulsório o que, em tempos de grave ameaça à saúde, proporciona uma agilidade que pode salvar centenas ou milhares de vidas salvas. Atualmente o licenciamento compulsório só pode ser emitido nas seguintes situações: emergência nacional, interesse público ou incapacidade de atender o mercado brasileiro. Todos esses casos dependem da abertura de negociações com o titular da patente e uma série de atos do poder Executivo. Com o PL 1.462/2020 essas condições são flexibilizadas.
“A epidemia da Covid-19 mostrou o quanto é importante que os esforços que a sociedade e os governos empregam, ao correr contra o tempo para atender as pessoas e a salvar o máximo possível de vidas, não sejam interrompidos por detentores de patentes, como aconteceu em várias partes do mundo, quando ameaçavam ou tentavam impedir na Justiça ações de grupos e pequenas empresas em pleno pico de contágio e com um número crescente de mortos por dia”, comentou Pedro Villardi, que representa a ABIA na coordenação do Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual (GTPI). “Uma ampla base de produtores é fundamental para que consigamos superar o quadro de exclusão do acesso a bens de saúde, observado em tantas epidemias passadas e que está se desenhando nessa pandemia. Impedir monopólios é uma medida estratégica, que dá folego aos sobrecarregados sistemas de saúde, e por meio da Licença compulsória é possível que isso seja feito de forma legal, com a devida compensação aos detentores de patentes”, afirma.
Villardi ainda enfatizou que a proposta legislativa não tira o direito do proprietário da patente de continuar comercializando os seus produtos e que receberá royalties para cada venda por outras empresas do produto licenciado.
“A busca é por opções de compra por parte do governo, opções que estejam ao alcance e com a agilidade para distribuição que uma emergência de saúde exige. Quem detém a patente vai continuar vendendo, só não poderá fazer isso na forma de monopólio”, explica.
O que é a licença compulsória?
A Licença Compulsória é um dispositivo legal previsto no Acordo TRIPS, da Organização Mundial do Comércio (OMC), da qual o Brasil é membro. O Acordo TRIPS é um tratado multilateral que regula o tema de direitos de propriedade intelectual no mundo.
As pandemias se encaixam entre os casos muitos específicos onde é possível emitir uma LC, quando prevalece o interesse público para que o país possa utilizar o produto patenteado, mesmo que o detentor não autorize, em nome da garantia do acesso a medicamentos essenciais. A LC também prevê um tipo de remuneração ao detentor da patente, resguardando seus ganhos.
Em 2007, o Brasil usou pela primeira o mecanismo. A licença compulsória foi emitida para o medicamento Efavirenz, da farmacêutica Merck Sharpe & Dohme, dos Estados Unidos. Inicialmente passando a importar uma versão genérica da Índia, o custo do tratamento paciente/ano com Efavirenz caiu de US$ 560 para US$163,22, o que gerou um impacto imediato de US$ 31,5 milhões em economia que, nos primeiros cinco anos chegou a cerca de R$ 237 milhões no orçamento do Ministério da Saúde.
Medicamentos em teste contra o Covid-19
Levantamentos, como o elaborado pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial, apresenta uma lista de produtos com potencial para o combate à Covid-19. Um levantamento preliminar do GTPI mostra que muitos destes produtos possuem pedidos de patente no Brasil, o que reforça a importância da aprovação de PL.
“O Brasil passa por um momento de apreensão enquanto olha para o drama dos lugares onde a pandemia chegou antes, como Itália, Espanha, Irã e Estados Unidos. O Presidente da Câmara, Rodrigo Maia, precisa agir rápido e colocar o PL 1462/2020 para votação. A aprovação desse PL é urgente. Precisamos assegurar máxima capacidade de resposta para salvar vidas. É inconcebível qualquer atraso ou alto preço durante tempos como o que vivemos”, concluiu Villardi.
Fonte: GTPI